8 de maio de 2004

Diário da Fonte

O PERFIL DA INDIFERENÇA

Agora que a soldada Linddie England posa com seu cachorro iraquiano, olhando com extrema indiferença o animal que ela traz à coleira, onde estão as matérias sobre a "mulhér", essa pauta rotativa infame que todos os dias tenta enquadrar indivíduos num gênero ideal, amorosamente feminino? E por que a imprensa fica fazendo a biografia da torturadora e nada fala sobre o torturado? E por que a imprensa acha normal que Bush prepare um massacre em Cuba?

ARROGÂNCIA - Num arroubo que mistura surto com prepotência, o antropólogo Roberto da Matta escreve no Estadão que é adepto da ginástica e da boa forma e sai-se com esta, mais ou menos assim: "esses olhos, que apesar da forma física, a terra um dia há de comer". é impressionante, ele descobriu os limites da própria divindade. O neo-autor (ou não-autor) Abilio Diniz, ao fazer o estrondoso lançamento da sua biografia, confessa que ele era tão bom, mas tão bom, que nem se dava conta. Aí ele mudou: ficou melhor. Como diria o funileiro Sádi: "Mas é prensionante". Outro não-autor de livros, Washigton Olivetto, crava o quinto lugar dos mais vendidos da Veja com seus piores textos. O não-livro de não- autores é a porção pseudoadulta da doença infantil do livrismo. O objetivo é transformar o livro num sabonete descartável e deixar de lado os autores, aquelas pessoas, aqueles indivíduos (homens e mulheres) que constroem uma obra atendendo aos ditames da própria vocação. Esses, ficam em segundo plano. O que temos é uma enxurrada de pseudolivros - tem até livro do jogador Marcelinho Carioca - desovados num mercado que quer ler e precisa lutar para encontrar coisa boa, normalmente escondida pelos vícios das vendas. Um romance de estréia ganha espaço nenhum na grande imprensa e exposição zero nas livrarias, ocupadas com orgasmos múltiplos e dicas de como ficar rico. Enquanto isso, nossos pares, alguns escritores que ajudamos a expor, nos entregam bolas quadradas pelos cantos, a expor indiferença em relação a um trabalho que custou sangue, suor e lágrimas. É assim mesmo: o retrato da nossa época é a Lindinha England arrastando seu prisioneiro pela coleira. Segundo a família da própria, ela estava obedecendo ordens, portanto é inocente. Os culpados são os grandalhões. Ao vermos as fotos em que ela debocha do pênis de um prisioneiro, podemos imaginar o que sentia de poder diante dos barbados, protegida por uma quadrilha de gângsteres que tomaram o poder via fraude eleitoral, como provam Michael Moore e Greg Palast, e que se preparam para invadir Cuba depois da morte de Fidel Castro. São uns covardes. Acham que o poder de Cuba vem de Fidel e não do povo. Os outros povos não existem, assim como o chamado " resto do mundo" - que é resto porque se comporta como resto.

REBOLADO - De repente, o de sempre: mulatas semi-nuas rebolando em frente a uma loja de departamentos em Londres, a mostrar que o Brasil é um país de pernas abertas para o mundo, a exigir que o estuprem. O miquinho amestrado Denilson fica fazendo piruetas com a bola, a desmoralizar o futebol penta-campeão, que é vitorioso graças ao povo que tem e não por ser macaquinho de circo. O nome do evento é Brasil 40 graus. Pega carona no trabalho de Nelson Pereira dos Santos, que é um cinema de afirmação da soberania. O resultado é o oposto: o Brasil que aparece agora é o que está sob o tacão da ditadura civil (saque internacional do trabalho dos brasileiros). Servimos de play-ground para o mundo, que se encanta com nossas mulheres peladas sob o sol. Aqui em Floripa, choveu uma semana e começa a fazer frio. Um Brasil amoroso e tranqüilo, mas lutador e muito invocado. Faça uma crítica a um catarinense para você ver. Ele reage à altura, pois afirma-se como brasileiro soberano e livre todos os dias. Esse tipo de postura não existe nessas promoções que colocam o Brasil como uma ilha do Caribe, que fala espanhol e está submetida a Buenos Aires. Antes tivéssemos estadistas com a postura do presidente Kirchner, que deu um chega para lá nos credores e negocia com altivez o seu país saqueado. Ele faz isso porque sabe: se marcar touca, o povo argentino saiu às ruas e o derruba. Aqui, vimos todos os partidos, sucessivamente, enriquecerem. Chegou a vez do PT. Até quando?

RETORNO - Claudio Levitan vai apresentar no Sesc Pompéia, no domingo, sua obra A Longa Milonga. Levitan é talento múltiplo: escritor, poeta, compositor, instrumentista, cantor, desenhista, arquiteto. Conhecê-lo é um privilégio. Privar da sua amizade, uma honbra. Levitan ilustrou meu livro de estréia, Outubro. Desenhos maravilhosos de um grande artista. Não percam, vão lá vê-lo e ouvi-lo e descobrir esse cara magnífico que precisa ser conhecido em todo o Brasilo que ele tanto ama.

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