4 de novembro de 2004

GLOBO ELEGE BUSH


A Rede Globo mostrou como se faz uma campanha política por meio de uma cobertura que tem cara de jornalismo, tem corpo de jornalismo, tem rabo de jornalismo, mas não é jornalismo, é marketing. A campanha de Bush foi apresentada numa seqüência impressionante de manifestações populares, com o repórter global aparecendo em todos os aeroportos onde o candidato pousava carregando o tripé da câmara, numa representação convincente de que está trabalhando (trabaiá é fazê baruio e carregá peso). Já o pobre do Kerry aparecia apenas em dois momentos, enregelado, diante de uma pequena platéia. Kerry perdeu a eleição ali. The winner is?Gloôôôbô!

CERCO - Há um desafio para a cultura mundial. A de disseminar a leitura e a reflexão (fruto do silêncio) para contrapor-se à bandidagem no imaginário das nações. A hispanidad, como sempre, ficou do lado do mais forte e atirou-se nos braços do cara que transformou o mundo num terror só ao mentir sobre as ligações entre o 11/9 e o Iraque, entre outras contrafações largamente apontadas pela literatura anti-Bush. O Mais! de domingo, na Folha, publica hilário texto de Norman Mailer que diz, entre outras coisas, que Bush tem o sorriso de comedor de excrementos. Isso se chama jornalismo: saber acertar na mosca quando se trata de contrapor-se aos ditames da direita. Aqui, estamos mudos. Internet são palavras ao vento. Vale o que está escrito, ou seja, impresso. Ou o que está na cabeça de todos via TV. Descobri que a verdadeira TV fechada é a chamada TV aberta. Como não tenho mais, por enquanto, TV a cabo, descobri que as redes disponíveis cercam o telespectador num círculo de miséria e de horror. Uma saída é a blogosfera, que ontem estava lotada. Tentei postar este texto logo depois dos resultados que davam a vitória ao Ogro e não consegui. O blog por enquanto é território livre e está sendo tremendamente utilizado pela imprensa americana. Aqui blog ainda é encarado como brincadeira de criança, apesar dos excelentes espaços mantidos por vários jornalistas. O que está faltando nos blogs brasileiros é erradicar o hábito de coluna social. No fim, quem venceu a parada na nossa imprensa foi o Ibrahim Sued, o cara da exclusão, que distribuía bola branca e bola preta para as pessoas. In e out, ou o sobe e desce da Veja, repetem a fórmula. Os posts milimétricos, para, digamos, facilitar a leitura (leitura é reflexão, é um trabalho árduo, não precisa ser facilitada) estão por fora. Textos completos, por favor.

PRECONCEITOS - Ninguém imagina o eleitorado como um conjunto de cabeças pensantes. Imaginam uma massa de manobra do marketing. Agora querem explicar a derrota da Marta Suplicy como se fosse culpa dos preconceitos. Besteira da grossa. Marta traiu o eleitorado ao nada fazer pela cidade, ao deixá-la o caos que é há décadas, a cuidar apenas de sua imagem de aristocrata dos jardins, achando que isso lhe dava autoridade, pois acha que o povo respeita os ricos. O povo respeita seriedade, sobriedade na terceira e em qualquer idade, realizações a favor da população. Um analista da Folha chegou a sugerir que o fato de ter feito pouco pela saúde é até um elogio, pois significaria que fez muito em outras áreas. Que outras áreas? Sem saúde não há vida. Pela educação? Encheu os bolsos das empreiteiras com o tal de CEU (projeto mal chupado do Darcy Ribeiro e do Brizola, que na época em que lançaram os Cieps foram acusados de demagogos pelos caras que hoje estão no poder)? Outro analista, este dentro do PT, diz que a culpa foi do Eduardo Suplicy, que se fez de coitadinho. O fato é que o povo cansou dessa família Suplicy, com o tal de Supla, que finge ser punk, seguido pelo songa monga do Eduardo, tudo coroado pela quase ex-prefeita. Deu para bola. O povo repudiou tudo isso. Vamos ver se Serra vai ficar enrolado nos seus preconceitos e sua falta de visão e fazer caca na prefeitura paulistana. Serra precisa se convencer que ganhou não porque seja o rei da cocada preta, mas porque o povo apostou nele depois de se desencantar com Lula e Marta. Ele tem a oportunidade de ouro de fazer pelo país o que ninguém fez. Mas Serra é de confiança? A maioria achou que é. Eu votei em trânsito. O maior desastre, para mim, foi o Paulinho no PDT. Paulinho nada tem a ver com o PDT. Quando o PDT vai tomar jeito?

MATINÊS - Batíamos os pés nas matinês para exigir que o filme começasse. Quando a luz acendia no meio da sessão, exclamávamos: ah, roubaram! Pois a cena que estava passando sumia e aparecia outra. Significava que havia roubo de muitos metros de filme. Fazíamos o gesto com as mãos, calculando o quanto de filme tinha sido surrupiado. Hoje rezamos para que haja algum filme na TV, qualquer um, que não nos expulse da sala. Acabou o deslumbramento diante das imagens. Para a minha geração do cinemascope, em que a majestade dos filmes (dirigidos por grandes diretores, como William Wyler e David Lean) nos deixava grudados nas cadeiras, é uma pena descobrir que as coisas podem andar para trás. O que nos espera nestes quatro anos de mais Bush? Fatalmente mais mentalidade colonizada. A Folha exagerou com a palavra Império, reproduzindo fotos tiradas de baixo para cima dos dois candidatos, com a bandeira listrada e estrelada ao fundo. Mais quatro anos significam também mais uma temporada de literatura anti-Bush. Mike Moore e companhia não foram suficientes para derrotar o cara. Insistirão na tecla ou vão mudar de estratégia?

RETORNO - Está anunciado: O programa Leituras desta semana, da TV Senado, produzido e apresentado pelo jornalista Maurício Melo Júnior, traz o escritor Nei Duclós, que estréia como romancista com o livro Universo baldio. Dividida em duas partes, a obra destaca, através de um resgate histórico, a década de 70, o clima de tensão vivido na época da ditadura. No ar: Sábado, 06/11, às 9h30 e 20h;Domingo, 07/11, às 20h30.

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