8 de março de 2005

A BURRICE DA VIDA PÚBLICA


Chico Buarque estaria jurado de morte porque deu bandeira com mulher casada no Leblon, à tarde. Chorão, do Charlie Brown Jr. provoca acidente com feridos ao atravessar sua Blazer na avenida porque o grande aviso de Pare desenhado no cruzamento era apenas uma sugestão (não havia farol, ou sinaleira, portanto estava desobrigado). Severino Cavalcanti é lançado à presidência d República. Luis Nassif defende seu direito de chamar amigo preto de negão. Nos programas de TV, a desconstrução total do pensamento: pessoas são submetidas por horas a uma saraivada de depoimentos sobre sua vida pessoal, exposta publicamente. Deputados querem a cabeça de Lula porque ele confessou ter abafado escândalo no Banco Central. Quem tem uma âncora no pescoço chamada Waldomiro Diniz não pode se arvorar a ter autoridade, dizem de José Dirceu. Martha Suplicy, que deixou um rombo de dois bilhões de reais na prefeitura paulistana, segundo seu sucessor, volta da Europa com todo o cacife para disputar o governo do Estado. Enquanto isso, o tédio mortal assola a cidadania, brindada com todo o cardápio asqueroso da burrice entronizada no poder e na mídia. A cultura, que é o encontro entre pessoas dedicadas à criação, fica de lado. As livrarias estão atulhadas de asneiras. Crianças só pensam em sexo. Gangs se enfrentam em lutas de morte. Daqui a um ano e meio, teremos eleição presidencial.

SOBERANIA - Lula revelou-se o rei do marketing forçado. Vai usá-lo de todas as maneiras para se reeleger. A direita terá força em 2006, já que a moral foi deixada de lado pela esquerda, que agora se locupleta no poder. Ex-comunistas voltam à propaganda política propondo um novo caminho. Esse apelo morreu junto com o governo Lula. O que vai vingar na campanha é a pena de morte, o fim da prostituição nas ruas e na mídia, a homofobia, a repressão aos movimentos de reivindicação popular, na cidade e no campo. A democracia brasileira está identificada com o caos e o entreguismo da soberania nacional. A direita procura um nome. Esboçou Aécio Neves, que já perdeu gás. Apressa-se com Severino, mas este não tem fôlego. Pode voltar com FHC, que está definitivamente queimado. Sugere César Maia, mas o Rio de Janeiro em guerra é seu cartão de visita. Maluf já foi. Quem será o candidato da direita, com reais chances de ganhar? A História mostra a receita: Jânio Quadros, Collor de Mello, no passado, serviram direitinho. Desta vez, basta escolher um nome e colocar a máquina da propaganda a funcionar. Uma alternativa é inventar algum prefeito ou governador para ser a salvação, a esperança que resta. Enquanto isso, Lula contará com o hábito, com o deixa estar para ver como fica, e tem chances ainda reais de ganhar, mesmo que seja no segundo turno. Mas o governo Bush mostra claramente o que deverá acontecer: a guinada total para a direita em toda a América do Sul. Hoje, há um quadro de saturação da esquerda, desde Lula ao presidente peruano. O pragmático Kirchner não se revela uma tendência. Vem aí uma tempestade de merda.

TRABALHISMO - Quem vive, como eu, numa terra de conservadores em todos os estamentos sociais, vê claramente o que está ocorrendo. Toda a campanha da esquerda a favor da cidadania volta-se contra ela. Cada pessoa é um delegado de polícia, um advertente de dedo em riste, um moralista à antiga (já que a moral foi deixada de lado pelos progressistas, que perdem a luta contra o tráfico de drogas e armas e ocupam importantes cargos no poder). A saída é resgatar o trabalhismo para as suas bandeiras e escolher um candidato que acene com o futuro, que é a harmonia, garantida por lei, entre capital e trabalho, assestando as baterias contra a corrupção e a pirataria financeira, dando ênfase ao Brasil soberano, sem cair na armadilha direitista do moralismo ultra-retrógrado. Um resgate histórico com uma plataforma pragmática, focada na infra-estrutura e na distribuição de renda via economia responsável. Como pode alguém especular com o preço do feijão? Por que quatro multinacionais dominam a produção e exportação da soja, o deserto verde que toma conta de todas as terras férteis do país? Por que o trem, no Brasil, pertence ao passado, quando ele é o transporte do presente do e do futuro, como provam a Europa e o Japão? A tarefa é dura e não temos tempo suficiente. Certamente teremos mais um arreglo trabalhista com candidatos pífios e voltaremos à vaca fria. Haja.

MULHER - Um dia de homenagens à mulher é apenas insumo para pautas rotativas, aquelas que se repetem à exaustão. Privilegiar o gênero em detrimento do indivíduo é um erro crasso. Hoje é dia de Condoleeza Rice, a interventora do Iraque? Mande flores para ela. Ela vai sorrir de alegria, com aquele riso de vampira. Homenageie Clarissa, Ana Terra, Cecília. Mas não a Mulher, essa bandeira publicitária cheia de equívocos. Um deles é achar que as mulheres só passaram a ter existência a partir dos 60. Antes, eram uma pobres coitadas. Dá licença. O matriarcado, o poder exercido pelas mulheres, é uma invenção ancestral. A pílula anticoncepcional, a panacéia da liberdade feminina, virou pó, basta ir a qualquer maternidade, onde sobra concepção não desejada.O que é preciso reforçar é outra coisa. Cada indivíduo deve existir em função de alguém, já que deve a vida a pelo menos duas pessoas.

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