29 de março de 2006

HOUVE UMA VEZ A REPORTAGEM




Não existem mais repórteres. Os jornais se limitam a reproduzir o que o novo ministro da economia falou. Na hora, ninguém fez a pergunta óbvia. Vejam o que Guido Mantega disse ao tomar posse (segundo pesquisador americano, expressão que só existe no Brasil): "Em 2004 o Brasil deu início a um ciclo de desenvolvimento continuado com as características de desenvolvimento econômico, distribuição de renda, geração de empregos e redução da pobreza. Em grande parte tudo isso se deveu à tenacidade e à competência do ministro Antonio Palocci, a quem rendo minhas homenagens e o respeito de companheiro de longa data". A pergunta é: como assim, desenvolvimento continuado, se o Brasil cresceu menos de três por cento, abaixo da média mundial e só superou o Haiti, um país em frangalhos e em guerra? Um repórter não tem que fazer salamaleques para o que chamam de liturgia do poder (como se o governo fosse um conjunto de Papas). Não tem que colocar as mãos em xis na altura dos países baixos e sacudir afirmativamente a cabeça, e de vez em quando torcer toda a boca para baixo e os lábios para frente, e olhar para os lados, como a confirmar o que o poder está proferindo, como fazem os papagaios de pirata.

CPI - Sr. Ministro, estamos retrocedendo, a miséria toma conta do país, os empregos de carteira assinada são subempregos em sua maioria. Já sei: não fazem essas perguntas e observações porque senão o repórter será acusado de tucano. Essa é a arapuca: destruíram o jornalismo para transformar tudo em publicidade e jogaram a reportagem no lixo. Mas se um dos maiores e gloriosos repórteres confessa publicamente que não existe mensalão e que houve excesso ou pressa da mídia nas denúncias, sem se dar o trabalho de ver o que a CPI recolheu de informação? A mesma CPI dos Correios que tem seu relator e a família, conforme denúncia do senador Pedro Simon, sendo ameaçada pelos gângsters? Srs. repórteres: os srs. não foram um dia nos arquivos da polícia para descobrir a seqüência de assassinatos de jovens pobres e inocentes? Agora mergulhem nos dados da CPI e façam o mesmo. E perguntem ao ministro: como a pobreza reduziu se as crianças estão sendo assassinadas no tráfico, na guerra entre gangs? Costumo me perguntar como esse tipo de gente consegue dormir. Vivem num mundo paralelo, com dinheiro público subsidiando o combustível deles. Não tiro meu carro do meu bairro. Ando daqui para mais ali. Pois gasto uma grana preta com gasolina. Sempre foi assim, desde que conheço esta ditadura e faz tempo.

TUBARÕES - Em qualquer ambiente profissional ou doméstico, quem é pego em flagrante sai escorraçado. Não é o caso dos tubarões que assumem cargos. Eles saem lampeiros, homenageados e daí a pouco são contratados por algum banco ou agência financeira. Porque a ditadura, que é do capital financeiro especulativo, precisa da corrupção para se manter. Nada menos confiável do que a ética. A honestidade causa calafrios. Para começar, não existe. Sempre somos culpados de algo, queiramos ou não. Não podemos criticar nada também, pois fazemos parte dessa curriola, segunda a ótica bandida que nos governa. Mientras tanto, como dizem os hispânicos, uma garota mata outra em frente ao colégio porque estava disputando namorado; qualquer chuva alaga São Paulo; a atriz da Globo e ex-esposa de Flavio Rangel cai do décimo andar de um edifício. Tudo normal. Rendemos (de renda, bufunfa, grana) nossas homenagens ao ministro que está sob suspeita. Quanta injustiça, nem permitem que o homem toque sua fantástica política econômica. É como dizia aquele sujeito: não me deixam mais matar em paz.

RETORNO - 1. O velho armeiro Mario Chimanovitch, grande repórter com quem trabalhei na época da revista Senhor, confessa que teve súbita saudade do poeta e me envia urgente mensagem.: "Por onde andas ? Todos ou quase todos se desvaneceram, como um caminhão de mudanças que se perde na fumaça, para onde ele passa ? Quando o orgulho esmaga as asas, o tempo é um pássaro de natureza vaga... Dê notícias. Ximana". É que o jornalismo acabou, Ximana. Para onde foram aquelas redações? Não podemos fazer essas perguntas, pois senão nos chamam você sabe do quê. 2. Minha estréia no Literário no Comunique-se é amanhã, quinta-feira, e não hoje, como anunciei ontem.

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