21 de junho de 2006

CLOSER: O AMOR NO AQUÁRIO





O conteúdo de um aquário está exposto (aberto) e ao mesmo tempo fechado no seu próprio mundo. É a metáfora perfeita usada pelo filme Closer, de Mike Nichols (2004). Relacionamento amoroso é uma antiga especialidade do diretor, como podemos ver desde Carnal Knowledge (1971). Se no seu filme antigo (e tão terrivelmente moderno na época), o tédio e o vazio eram os motores da trama da troca de casais, neste é o desespero gerado pela situação limite: tudo está próximo demais, transparente, e ao mesmo tempo fechado, inacessível - fazendo jus assim ao título em inglês, que tem esse duplo sentido (closer é o que está perto e é aquele que fecha). É por isso que o aquário, que tem exatamente essas características, é a metáfora maior do filme: tema do romance de Dan (Jude Law ), local de encontro entre Anna (Julia Roberts) e Larry (Clive Owen), o amor no aquário expõe a stripper Alice ( Natalie Portman), monitorada o tempo todo no clube onde trabalha. Não se pode tocá-la. A única ponte é o olhar e a fala, o roteiro de Patrick Marber, baseado em sua peça teatral.

CARGA - Os diálogos assim formam uma criatura à parte, que usam os protagonistas para manter o ritmo da agonia de vidas que se aproximam e se afastam, se expondo o tempo todo. A saída para o impasse, pensam eles, é arrancar a verdade dos que amam ou pensam amar. Saber de tudo é uma espécie de compensação pela impossibilidade da convivência verdadeira. Mas eles cercam a verdade sem importância, como saber se foram traídos ou não, enquanto esquecem o principal: qual o verdadeiro nome da pessoa que é amada, por exemplo. O nome conta, pois significa a identidade perdida, a casca abandonada junto com o sofrimento. Saber o nome verdadeiro significa carregar o ethos perdido, mas qual relacionamento hoje resistiria a essa carga. O ideal é escolher uma nova denominação, para que haja uma chance. O nome adotado é escolhido a esmo, no local onde se revela o amor, mas ele traz um estigma: o passado, que assombra o mundo prisioneiro no eterno presente.

VIDRO - O sinal está fechado para que as pessoas cumpram seus rituais viciados e burocrátioas, de indivíduos anulados no ritmo da massa. Romper o sinal, cruzar a rua sem rede de segurança, é confiar que alguém virá em seu socorro, ao seu encontro. Só assim, arriscando, é possível cruzar a parede do aquário e tocar na pessoa amada. É o que faz Jane/Alice: segue em frente, mesmo que haja impedimento para a busca de um novo amor. Ela sabe que não poderá encontrar nada se obedecer ao que está disposto num mundo oco, fundado na mentira. Ela, que usa a representação até o fundo, pois se expõe no clube para sobreviver, atravessa a avenida no momento em que os carros se soltam e as pessoas estão paralisadas, para encontrar a sua verdade, usando o verdadeiro nome. Ela quebra o vidro do aquário com seu passo decidido, que implica risco de vida.

CLASSES - O conflito do filme não releva as diferenças de classe social. O jornalista frustrado que tenta ser escritor vê na fotógrafa bem sucedida a porta de entrada de um mundo fora da escassez e dos limites da pouca remuneração. A fotógrafa pergunta para Alice se seu trabalho de garçonete é temporário, ou seja, se é alguém de uma classe social superior que está fazendo apenas um bico ou passando por uma experiência. No fundo, ela concorre com Alice numa disputa de poder baseada no privilégio. Enquanto seu trabalho é desmascarado por Alice na vernissage, ela cede à tentação de voltar para Dan: eis o momento em que a riqueza se curva diante dos menos favorecidos para tirar deles seu último bastião, a alma capaz de amar.

RETORNO - Alice ( Natalie Portman) em Closer: quebrar o vidro que expõe e afasta.

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