3 de novembro de 2008

VIA LÁCTEA


Nei Duclós

Quando o cristal se quebra
E risca o céu de mármore
E o verbo verte o vírus
Que recompõe a treva

Quando a torre enterra
O sino. E a ponte
cruza a mesa incerta
de borra e vinagre

Quando o sal carrega
a praia de migalhas
E o torpe enredo ganha
Status de refrega

E tudo se atrapalha
No atalho sombrio
do canudo em pane
entre o frio e o ferro

Quando tudo mata
O minuto inabitável
Do amor que enfim
No corrimão se molha

É hora do poema
Ângelus sem asas
Murmúrio de sargaços
Travo ao fim da tarde

Épico de alarmes
Arames de morcegos
Alho inodoro no portal
A espantar mortalhas

É hora do poema
E do catador de palhas
O que acende lampiões
Na Via Láctea


RETORNO - Imagem de hoje: A origem da Via Láctea, de Jacopo Tintoretto.

Nenhum comentário:

Postar um comentário