14 de junho de 2010

COPA 2010: ADIDAS E FIFA MUDAM O FUTEBOL


Conseguiram enfim. Não bastou jogar todo o poder no futebol no colo da publicidade, que coloca marca até na bunda dos jogadores no Brasileirão. Não bastou implantar uma política extrativista de recursos naturais sugando craques prontos ou em potencial de todo mundo para abastecer os shows milionários na Europa. Não bastou transformar o amor à camisa em fidelização de produtos ou inflar o valor dos craques dentro da lógica da especulação financeira pirata e predatória. Também não bastou abafar escândalos sucessivos de arbitragem, eternidade de cartolas nos cargos e monopolização total do jogo sob as ordens da Fifa. Precisou fazer mais. Precisou iniciar a desconstrução definitiva do futebol por meio da bola Jabulani.

A Adidas fabrica a bola Jabulani na China (o nome africano é só marketing), com mão-de-obra escrava. Por custarem quase nada, os operários chineses mantêm o enriquecimento crescente de maganos como os donos da Nike, Adidas e outras multinacionais (não há corrupção na China? Toda essa bufunfa não azeita cargos importantes na ditadura chinesa?). Agora começa a haver greve no império das quinquilharias e produtos fajutos.

É a maior tralha, porqueira, ou o que se diga dessa bola de plástico de supermercado ou de praia que caiu como um petardo no miolo da mais importante competição de futebol do mundo. Vejam os frangos, o gol contra, a bola disparando miseravelmente com qualquer toque, voando para fora dos limites, atingindo arquibancadas, cruzando o campo com facilidade. Lembram como Pelé deslumbrou a todos chutando a gol da linha intermediária? Era difícil fazer um lance desses com uma bola decente. Com a Jabulani, virou brincadeira.

Adidas e Fifa querem que o futebol seja só show e não mais um jogo tradicional, com fundas raízes no imaginário e identidade das nações, que é a maior riqueza desse esporte e, paradoxalmente, está sendo jogado no lixo. Mudaram o peso, fizeram a bola com oito gomos e não 32 para mudar o itinerário dos chutes. Todo mundo vai ter que se adaptar. O tiro está saindo pela culatra: como ninguém consegue dominar o troço, são poucos os gols. Por enquanto, a atual geração de jogadores virou um bando de peladeiros, errando tudo, porque a porcaria escapa, por ser outra coisa, menos uma bola oficial de futebol. Mas notem o desprezo que vai atingir a formação dos craques. Crianças crescerão com a merda da bola e só saberão jogar com ela. Que tipo de jogadores serão? Facilmente manipuláveis, já que o futebol vai virar loteria, ganha quem tiver mais sorte tocando na quinquilharia.

O desplante com que colocaram o principal objeto do jogo, a bola, numa Copa sem avisar ninguém, sem que ninguém soubesse o que aconteceria, é um escândalo sem precedentes. Não adiantou os jogadores chiarem. Foram acusados de serem empregados da Nike, daí a reclamação. Não foi levado em conta que nosso goleiro Julio César tinha razão ao reclamar primeiro, Robinho sabia o que estava falando ao dizer que ela não prestava. Vemos o resultado nos jogos. A bola faz o que quer e todo mundo faz papel de palhaço. Ok, o goleiro inglês Green já tinha tomado frango antes. Mas vejam como ele foi com segurança na bola e acabou sendo traído por ela.

A Copa do Mundo é um confronto entre nacionalidades. O que se usa nas arquibancadas e nas comemorações são as imagens que os países fazem de si mesmo e uns dos outros. Mas em campo vemos pessoas idênticas de qualquer país, com algumas variações raciais, mas nem tanto, já que tem pele diferente em quase todos os times (com exceção das eugenias asiáticas). A Copa, além de ser um up-grade, uma atualização sobre o esporte, é também a prova de que não há mais diferenças significativas. Tudo foi reduzido ao mesmo estilo de vida, apesar de serem nacionalidades bem marcadas, ditadas por fronteiras consolidadas, o que nos salva da barbárie, por enquanto.

Os povos diferem nas suas identidades nacionais, mas não no estilo de vida. Leis, bandeiras, hábitos, geografias de um lado. Fast-food, internet, roupas esportivas de outro. No futebol as coisas se misturam. A modernidade mantém tudo sob o mesmo jugo, repetindo inclusive as diversidades internas (populações com várias etnias, por exemplo). Mas a cultura, a memória e a vivência em espaços diferentes trabalham uma outra diversidade. É complicado. Nas seleções, existem equipes que são legiões estrangeiras. Isso diminui ainda mais as diferenças dentro de campo.

Mas a crônica esportiva, sem ter por onde pegar, e agarra a conceitos equivocados como característica e detalhe. É uma avalanche de características e detalhes nas narrações e comentários. Os estilos de jogar se parecem, mas a percepção da mídia força a barra de que existem diferenças gritantes. Para mim a base do que se joga hoje é uma só: prudência, um só toque por jogador, sintonia radical nos passes, chuveirinho na área, contra-ataques. O que diferencia não é o detalhe da jogada, mas o talento e a individualidade dos craques, que podem surgir em qualquer lugar. Mas não se pode centrar muito em determinadas estrelas. Ronaldinho Gaúcho não aconteceu em 2006, nem Eto´o estreou bem contra o Japão. Messi se saiu bem, mas não foi essa coisa toda que se esperou dele, por enquanto.

Talvez nem Kaká ou Robinho se destaquem. Minha aposta é num reseva. Nilmar, mas isso é só um palpite. O que me invoca é a insistência dos jornalistas em ficar medindo altura dos jogadores, como se futebol fosse basquete ou vôlei. Um deles chegou a dizer que o atacante alto nem precisou saltar para o cabeceio contra o gol. O cara se abaixou para cabecear! Esqueceram do Romário, baixinho entre gringos altos, que levava a melhor.

A Copa vai rolando. É sempre bom ver, apesar do cornetismo militante, uma falsa tradição na África do Sul, pois a moda da vuvuzuela foi inventada em 2001. Para mim, é espírito de porco ficar soprando o troço durante o jogo todo, atordoando geral. Muitos sul-africanos são contra, não apenas os estrangeiros.

RETORNO - 1. Imagem desta edição: Julio Cesar às voltas com a quinquilharia chinesa. Tirei daqui. 2. Saiba como a manifestação de massa contra o porta-voz do monopólio da Globo se transformou num case internacional hilário. Conheça o fenômeno #CalabocaGalvao

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