20 de junho de 2012

O ESTRAGO DO PRAGMATISMO PATÉTICO


Nei Duclós

O que mais Lula precisa fazer para desmoralizar sua biografia política depois de se abraçar com Paulo Maluf, foragido da Interpol e representação máxima da corrupção e da extrema direita, e que foi o motivo do crescimento do PT, criado para combatê-lo? O que resta para contrariar a onda elogiosa que grudou nele depois de sua política econômica tornar inadimplentes 40% das 32 milhões de pobres que ele inventou serem da classe média? Tudo o que já tinha feito, como elogiar Médici, aliar-se a Sarney, dizer que nunca foi de esquerda, não foi suficiente para afastar o carisma de líder popular. Nem o tsunami de corrupção que o cerca, junto aos seus aliados, derrubou sua soberba de estadista de estádios superfaturados e atrasados.

O pragmatismo patético que o levou a fundir-se com um Collor ressurgido, ressentido e metido como sempre, chega ao auge ao misturar a monstruosidade malufista a uma candidatura a prefeito que ele prometeu ser “o novo”. A postura da Erundina, ex-vice da chapa de Haddad, foi aparentemente ética e corajosa, mas ela faria o mesmo se o apoio do foragido da Interpol fosse feito nos bastidores? Pergunta-se também quanto foi pago para que o PT tenha acesso a mais um minuto e meio de TV (que não está caro, as biografias é que não valem mais nada) ?

Quando Lula teve o desplante de comparecer nos funerais de Brizola, a massa cantou o sucesso “você pagou com traição a quem sempre lhe deu a mão”. A traição é a vocação e a profissão de Lula. Ele devora tudo à sua volta. Beneficiado pelas lutas populares, imã que atraiu as reivindicações de um Brasil democrático, estuário de esperanças de uma nação em frangalhos, ele simplesmente jogou tudo fora em favor dos seus interesses, representados  pelos onze caminhões (um deles frigorifico com adega) na saída do Planalto, sem falar na mega-fazenda familiar, entre outras mumunhas .

É patético também ver a borrasca de artigos metidos a isentos de articulistas notórios a querer explicar o abraço suspeito em favor da manipulação do voto nas eleições municipais de São Paulo. Esse tipo de artigo medrou a partir de 1964 e foi cevado na entrelinha metida a elegante, mas não passa de covardia aparelhada. O argumento é que os tucanos não puderam chegar ao preço exigido por Maluf.  Mas é claro que é tudo a mesma coisa, vivemos na era tucano-petista-peemedebosta. Irrita esse nariz levantado para a podridão como se fosse possível manter as torres de marfim no momento em que todas as mídias fazem água com a revolução digital, que permite o acesso de multidões armadas de argumentos e poder de pressionar quem antes vivia impune pontificando.

A indecência do pacto sinistro Lula-Maluf põe por terra todas as ilusões de um falso estado democrático, pois isso, pelos antecedentes dos principais envolvidos,  tem o aspecto de negociação de máfia, jamais pragmatismo político. Se de um lado temos um foragido da Interpol  e de outro alguém acusado de ser o chefe do mensalão pela Procuradoria-geral da República (e agora há o esforço do PT de tirar do Ministério Público seu poder de investigação criminal), e acusado por um ministro da Justiça de ter chantageado em favor do desvirtuamento do diagnóstico judicial, não se trata bem de política, mas de algo que tem tudo para ser fora da lei.

O que faz a militância metida a esquerda que encheu o saco por décadas com essa pose pseudo politicamente correta, condenando tudo e a todos e agora caindo de boca no ex-arqui-inimigo, que revelou-se uma contrafação?O inimigo dessa canalha é a verdade. E o fato é que vivemos numa ditadura civil, desdobramento da ditadura de 1964 do golpe de estado, e de 1968 do AI-5, que em 1984 derrotou no Congresso as Diretas-Já para depois empossar o ex-presidente do partido da ditadura, que nem tinha assumido como vice de uma chapa eleita por via indireta,  num mandato tampão que preparou o atual regime,livre da farda. Esta, pagou todo o mico da tirania civil-militar.

Essa turma escudada numa posição metida a correta foi a desgraça de inúmeros eventos, desde os políticos, como o açulamento das radicalidades que desaguou no golpe de 1964 , até os culturais quando destruíram a carreira de vários artistas, como Sergio Ricardo (80 anos de dignidade) que se insurgiu contra quem o acusava de alienado por fazer uma música sobre futebol, Beto Bom de Bola. Pois agora engulam Maluf e o carreguem nos ombros. E assumam a idiotia política, facilmente manipulável por pessoas sem escrúpulos.

RETORNO -  Imagem desta edição: The Conjurer, de Bosch - um mágico tentando convencer o espectador que ele está puxando sapos ou rãs da sua boca. Enquanto isso, alguém que está por trás desse espectador, que está roubando sua carteira