23 de fevereiro de 2013

VENEZIANAS



Nei Duclós

A janela se fecha à serenata. Mas sei que respiras apressada através das venezianas.

Se eu estiver mudo é porque todo meu corpo te escuta.

Não te mereço, flor do campo. Não consigo colher o que me encanta. Sofro com essa falta de poder.

Versos que faço para ti antes do desmaio. O poema na véspera do mútuo agarro.

Não ouse amar sem que proves do meu beijo. Juro que não terás mais sossego.

Você é toda a delícia. Me sacias, belíssima.

Posso ser esse sonho. Releve apenas as cicatrizes, elas não importam. O que pega é meu olhar sobre cada detalhe de tuas curvas e meu mergulho nas águas que te consomem.

Tudo diante da beleza vira súdito. Tome tento sabendo a força do teu reino.

Quando não te canto não é uma trégua. É sobrevivência. Preciso recuperar o fôlego.

Dorme o sono injusto. Tanta beleza que descansar é um absurdo.

Nem a promessa de beijo me livra do que me agendaste de surra.

Queria falar sobre a guerra, mas abriste a blusa.

 Tão cedinho e já estás de prontidão. O corpo inteiro pedindo perdão por tanto querer.

Você é cheia de nove horas, mas finge que é meia noite.

Olhos cansados, óculos vencidos, viraste neblina. Talvez seja essa tua sina. E a minha, te perder de vista.

Crescente empurra o rosto na nuvem e fica aparecendo só uma parte de sua luz, meio ovalada, de alguém que conversa ainda deitada.

A Lua olha só com a metade do rosto. O resto esconde, por gosto.

Te recolhes fingindo sono. Mas teu trono vazio brilha no lugar da Lua que se foi.

Vi agora a Lua navegando acima dos arbustos. Rasante, faltando um tiquinho para a Cheia. Ou não falta mais nada, danada?

Levei um susto. No azulão da tarde, a Crescente me espreitava, pálida entre os fios e as folhas. Deixa eu ficar Cheia, disse ela. Aí vais ver só.


RETORNO – Imagem desta edição: Carol Lombard, por George Hurrell.