13 de novembro de 2017

O QUE SIGNIFICA O AMOR NA BANDEIRA



Nei Duclós

Querem introduzir o Amor para fazer companhia à Ordem e Progresso na bandeira nacional. Fiquei invocado mas não encontrei explicação, pois o amor na nossa época é coraçãozinho vermelho nas redes sociais, o amor romântico das novelas antigas (as mais recentes são pura porrada) e comedias românticas ou o amor placebo das igrejecas emergentes. Mas há uma explicação mais profunda e significativa, segundo conclusão que faço, mesmo correndo o risco de ser anacrônico, ver o presente com os olhos do passado.

Na leitura da magnífica obra O Mundo de Ponta Cabeça, do historiador marxista britânico Christopher Hill, já comentada aqui em outros aspectos, chego ao capítulo em que ele descreve The Law of Freedom, the Magistracy Ristored (A lei da liberdade, Restabelecer o governo legítimo) de autoria de Gerrard Winstanley (1609 – 1676), um radical dos ´século 17. O texto, em inúmeros itens de renovação social, econômica e política, tem todo um escopo de uma república ideal. Naquela guerra civil, a briga era primeiro contra o rei e o poder secular da igreja,e depois o sistema de opressão dos fidalgos conservados na República,, que se mantinha apesar da deposição do rei.

Na Wikipedia, Gerrard Winstanley é descrito como integrante do movimento "Digger" (cavadores, os grupos que resolveram cultivar as terras devolutas e cercadas pelos poderosos e que proibiam o acesso aos pobres), durante a Revolução Inglesa (1640-1660). Atuando de modo mais específico entre os anos de 1648 e 1652, já durante o período do Protetorado de Oliver Cromwell, Winstanley fora responsável pela publicação de uma série de panfletos em nome dos Diggers. Estes panfletos possuíram um caráter político-teológico, partindo de pressupostos milenaristas, onde defendiam, sobretudo, que segundo as leis de Deus a terra deveria ser comum a todas as pessoas. Para eles, a propriedade privada era necessariamente oriunda de "roubo, assassinato e opressão".

“Em 1652, após o fim da experiência Digger em 1650, Winstanley publica o que viria a ser seu trabalho mais conhecido, The Law of Freedom in a Platform, dedicado a Oliver Cromwell, considerado por diversos historiadores e historiadoras como sendo de gênero literário utópico. Nele, Winstanley descreve como a sociedade e o sistema de governo deveriam operar de modo a assegurar a posse coletiva da terra. “

A partir dessas informações e da leitura do livro de Hill, soube que a terra era vista como uma herança maldita, imposta pela espada após a Criação divina. A meta dos radicais, pregadores populares saídos de ofícios, urbanos e rurais, onde a palavra da pregação e da profecia era estendida a todos, era eliminar os grilhões da posse individual da terra e torná-la comum, coletiva. Isso implicaria numa nova situação social, fundada no Amor. O Amor era então o resultado da revolução em que os servos libertavam os opressores de suas funções malévolas e se abraçariam numa sociedade perfeita onde imperasse a concórdia existente antes da Queda do Paraíso.

Algumas sugestões de Winstanley, como o monopólio do comércio externo, foram adotadas por Lênin na revolução russa de 1917, segundo Hill. O Amor na política então está nas raízes do comunismo, o sistema utópico de nivelamento social. Nada a ver com coraçãozinho vermelho nem expressões como Amei. É barra pesada: tirar a terra dos seus proprietários e fazer com que o povo, em comum acordo, possa cultivá-la para a prosperidade de todos.

Não por acaso, acredito, essa proposta do Amor ganhou certo destaque nos últimos tempos. Há uma ideia, antiga, por trás disso. Sem julgamentos, só uma constatação histórica.
Lendo e aprendendo.

Nei Duclós

RETORNO - Imagem: soldados do New Model Army, do Parlamento, cercam os cavadores da colina existente ao lado de uma igreja, e que queriam usar a terra para o bem comum.

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